A Pirâmide Invertida - Resenha crítica - Jonathan Wilson
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A Pirâmide Invertida - resenha crítica

A Pirâmide Invertida Resenha crítica Inicie seu teste gratuito
Esportes

Este microbook é uma resenha crítica da obra: Inverting the Pyramid

Disponível para: Leitura online, leitura nos nossos aplicativos móveis para iPhone/Android e envio em PDF/EPUB/MOBI para o Amazon Kindle.

ISBN: 978-85-69214-07-6

Editora: Grande Área

Resenha crítica

Da gênese à pirâmide

O futebol surgiu como um esporte violento, físico, caótico e sem regras. Funcionava como uma espécie de rúgbi sem as mãos. O espaço para a estratégia e os passes curtos no lugar da agressividade desordenada surgiu no século 19, graças ao time escocês Queen's Park. 

Com apenas dois defensores, a pirâmide “2-3-5” foi um dos primeiros esquemas a se popularizar, usada pela seleção inglesa em 1884. Os passes curtos dos times escoceses rivalizaram com o estilo rápido e direto dos ingleses. 

A valsa e o tango

O poderoso Império Britânico não espalhou apenas relações comerciais para os países, mas exportou o próprio futebol. Com o esporte se internacionalizando, o inovador técnico de ascendência irlandesa Jimmy Hogan levou o estilo escocês com uma variação do “2-3-5” para clubes de toda a Europa. 

Os conceitos de Hogan foram adaptados por Hugo Meisl e deram origem à bem-sucedida seleção austríaca dos anos de 1930, apelidada de “Wunderteam”. Uma variação argentina do estilo também surgiu, com os clubes do país impressionando os britânicos por seu artístico “2-3-5”.

O terceiro zagueiro

As mudanças nas leis britânicas de impedimento fizeram com que os times se tornassem mais vulneráveis. Dois defensores deixaram de ser o suficiente e o inglês Herbert Chapman criou o terceiro zagueiro com a formação “W-M”. Em seu Arsenal, o meia central do “2-3-5” virou o terceiro zagueiro.

Já os atacantes das pontas e o central recuavam, criando um “3-2-2-3” na forma do inovador “W-M”. O sistema tático fez sucesso no final dos anos de 1920 e passou a ser amplamente usado na Inglaterra para substituir a tradicional pirâmide. 

Como o fascismo destruiu os cafés

Os cafés vienenses, em que os intelectuais se encontravam, eram o típico campo de debate futebolístico. O sucesso do elegante “2-3-5” do Wunderteam e seu atacante atleta-artista Sindelar fez os cafés entrarem em êxtase. 

Mas o Wunderteam entrou em declínio e foi superado pela seleção da Itália fascista, com sua obsessão militar pelo condicionamento físico e seu meio termo entre o “W-M” dos ingleses e o “2-3-5” danubiano dos austríacos. A morte definitiva do espírito dos cafés aconteceu com a anexação da Áustria pela Alemanha hitlerista, decretando o fim do projeto de Meisl.

Desordem organizada

O futebol que foi exportado por marinheiros britânicos nas docas de Odessa demorou para ser assimilado pela cultura Russa. O britânico Harry Charnock fundou o Dynamo Moscow no final do século 19 para afastar seus funcionários do vício em vodca.

Ao perceber que o “2-3-5” estava defasado em relação ao moderno “W-M” dos bascos, Boris Arkadiev assumiu o time em 1936 e promoveu uma “Perestroika tática”. Uma nova e bem-sucedida versão soviética do “W-M” passou a ser explorada pelo técnico, com o estilo de passes curtos “passovotchka”, movimentações indefinidas no ataque e “desordem organizada”. 

A conexão húngara

A falta de atacantes físicos fez com que Martón Bukovi recuasse um centroavante com outro perfil e criasse o “M-M”. O modelo se popularizou e Béla Guttmann espalhou a cultura futebolística do país pela Europa central, sendo o último técnico dos cafés vienenses. 

Mas sua origem judaica o fez temer o antissemitismo no continente e o treinador se juntou a Dori Kürschner entre os que vieram para o Brasil para fugir da intolerância europeia. Guttmann levou o São Paulo ao título paulista de 1957 e ajudou a desenvolver o “4-2-4” no país. 

Organizando o Carnaval

Embora tivesse uma cultura que priorizasse o improviso à estratégia, o Brasil em que Béla Guttmann desembarcou já tinha ideias táticas consolidadas. Um princípio de organização tática começou a ganhar corpo quando o misterioso estrangeiro Dori Kürschner popularizou o “W-M”. O húngaro treinou times como Flamengo e Botafogo nos anos de 1930. 

Seu sucessor, Flávio Costa, criou uma variação na seleção brasileira e foi bem-sucedido na maior parte do tempo, mas sofreu com a traumática derrota para o Uruguai que ficou conhecida como “maracanaço”. Ainda assim, a herança húngara, somada ao talento de Pelé e Garrincha, foi honrada com o título da copa de 1958 por Vicente Feola, ex-auxiliar de Béla Guttmann. 

O pragmatismo inglês

A evolução do futebol fez com que o antigo “W-M” não fosse mais a solução para os times ingleses. Apesar do uso de algumas ideias danubianas, a Inglaterra continuou a ter voos de galinha táticos e a depender predominantemente do físico. 

Com a ajuda do oficial da força aérea britânica Charles Reep, Stan Cullis trouxe a precisão estatística e o pragmatismo para o jogo. Os ataques com poucos passes também foram assimilados por Alf Ramsey, mas com o acréscimo de um inovador “4-3-3” que levou a Inglaterra ao título da Copa do Mundo de 1966. 

O nascimento do novo

O futebol soviético seguiu se desenvolvendo a partir do criativo Dynamo de Viktor Maslov, o inventor do “4-4-2”. O técnico adaptou a inovadora marcação por zona criada por Zezé Moreira e usada pelo Brasil na copa de 1954.

Mas o grande legado de Maslov é a invenção da pressão. Para o nosso autor, os jogadores de hoje são tão talentosos quanto os de antigamente, mas com menos espaço graças à pressão.

O catenaccio

Contrariando o “W-M” dominante da época, o italiano Gipo Viani decidiu investir nos atributos defensivos. Seu Salernitana se concentrava em povoar a defesa e esperar as jogadas dos times adversários para contra-atacar. O “catenaccio” defensivo virou tendência entre os pequenos times italianos.

Mas o controverso franco-argentino Helenio Herrera foi o expoente máximo do catenaccio nos anos de 1960, ainda que seus métodos fossem criticados pela violência, pelas acusações de manipulação de resultados e pelo possível doping com anfetaminas.

Depois dos anjos

Assim como Kürschner e Guttmann no Brasil, o misterioso judeu húngaro Emerich Hirschl explorou a Argentina trazendo novidades táticas. O legado foi continuado pelo vitorioso River Plate de Renato Cesarini, um ex-jogador de Hirschl. Esse sucesso tático se aliou a uma geração de talentosos e irreverentes jovens jogadores, apelidados de “anjos das caras sujas”.

Mas a violência foi incorporada à cultura argentina e técnicos bem-sucedidos como Victorio Spinetto e Osvaldo Zubeldía gerenciavam times extremamente físicos, brutais e provocadores. Os métodos passaram a ser reprovados por efeito das brigas generalizadas e fraturas que prejudicaram a imagem da Argentina no exterior. 

Futebol Total

Já passamos da metade deste microbook e chegamos a uma evolução brusca no futebol. A revolução cultural holandesa, o espírito pós-Segunda Guerra Mundial e a rebelião jovem da vanguardista Amsterdã criaram o cenário propício para mudanças. O futebol foi beneficiado pela alma intelectual do país e o resultado foi o chocante e revolucionário Ajax de Rinus Michels. 

Liderado pelo talentoso, crítico e iconoclasta Johan Cruyff, o time tinha as inéditas trocas rápidas de posições, acompanhadas de atacantes que marcam e defensores que jogam adiantados. O “futebol total” de Michels o fez treinar o Barcelona ao sair do Ajax e a lendária seleção holandesa dos anos de 1970.

Ciência e sinceridade

O amor pela ciência soviética de Valeriy Lobanovski o direcionou para uma abordagem sistemática do futebol. A inspiração do influente Viktor Maslov serviu para criar um eficiente sistema de pressão e contra-ataque, uma versão oriental do que era praticado no futebol total de Rinus Michels. 

A precisão estatística também era minuciosa, superando a de Charles Reep. Aqui, a análise por computadores e os métodos científicos de treino ganharam protagonismo. 

Leve-me para a Lua

A Copa do Mundo de 1970 com a seleção brasileira de Pelé e Rivellino criou um paradigma insuperável. A equipe que “chegou à Lua” do futebol era conhecida por seu futebol-arte irreverente, improvisador, talentoso e sem preocupação tática, mas foi a última do tipo. Parte do seu sucesso é explicado pela intensa preparação física, consequência da cultura tecnocrática do regime militar.

O investimento custou caro, com o opositor da ditadura João Saldanha sendo trocado por um ideologicamente seguro Zagallo no comando da seleção brasileira. Em uma luta pela alma do futebol, o talento dos brasileiros venceu a tática dos italianos, mas foi o fim de uma era. A talentosa e improvisadora seleção de Telê Santana em 1982 não conseguiu repetir o feito e foi vencida pela disciplinada Itália.

A volta do pragmatismo inglês

As ideias de Bob Paisley e um eficiente estilo de posse e passes à moda europeia contornaram o conservadorismo inglês e renderam ao Liverpool quatro títulos de Copas da Europa entre 1977 e 1984. Mas inspirado por Viktor Maslov, o jovem e não-conformista Graham Taylor foi na contramão do continente e trouxe para a Inglaterra a pressão. 

Seu Watford assumiu um estilo de bolas longas. Mas a versão mais radical do pragmatismo apareceu no Wimbledon de Dave Bassett. A estratégia tinha uma péssima estética e era pouco empolgante, mas se mostrou uma forma eficiente de levar clubes pequenos para a primeira divisão.

O retorno dos três zagueiros

A derrota da seleção brasileira em 1982 foi a vitória da tática sobre o talento. Mas o defensivo “gioco all’italiana” também caiu em desuso e precisou evoluir para um moderno “3-5-2”. O esquema foi bem-sucedido com Carlos Bilardo em 1986, em sua Argentina liderada por Diego Maradona. 

Um criativo “3-5-2” com inspiração no futebol total de Rinus Michels também foi aplicado por Sepp Piontek na Dinamarca. Assim, o futebol prático começou a ocupar o lugar do idealismo.

O técnico que não era um cavalo

Com a queda do “gioco all'italiana”, Arrigo Sacchi fez uma releitura das defesas italianas com um sistema integrado de pressão. O treinador discordava do padrão defensivo italiano e era mais idealista, acreditando que os times também precisavam ser encantadores e convincentes. 

Sacchi afirmava que técnicos não tinham a necessidade de serem ex-jogadores e justificava dizendo que um jóquei não precisava ter sido um cavalo. Seu bem-sucedido Milan o credenciou para treinar a Itália.

O vingador do futuro

Para continuar o legado de Rinus Michels, o Ajax apostou no, agora técnico, Johan Cruyff e em Louis Van Gaal nos anos de 1980. O mesmo aconteceu com o Barcelona, que quis retornar ao futebol de Michels com Cruyff e conquistou a Liga dos Campeões da Europa em 1992.

Na América do Sul, o futebol total foi introduzido pelo argentino Marcelo Bielsa em seu criativo Newell’s Old Boys, vencido apenas pelo São Paulo de Telê Santana na final da Libertadores de 1992. Mas a versão platense das ideias de Rinus Michels deixou seu legado no vitorioso bielsista Jorge Sampaoli. 

Os fantasmas e a máquina

A partir da invenção da pressão, o futebol mais mecanizado ocupou lugar de um artístico, nostálgico e idealista baseado no talento. Nessa mudança, Riquelme apareceu como a volta do camisa 10 clássico, chamado na Argentina de “enganche”. Era a personificação de uma ideologia, uma representação da poesia na era mecânica e sempre gerou opiniões mistas. 

Seu sucesso foi diferente do de Modric, o meia que representou o perfeito “regista” do futebol moderno. Se o futebol não tem mais espaço para o romantismo, a necessidade de polivalência e de universalidade criou um perfil de atleta multifuncional de excelência.

O triunfo do passe

O Barcelona tentou repetir o estilo de Rinus Michels algumas vezes, com nomes como Cruyff, Van Gaal e Rijkaard. Mas quem teve os resultados mais impressionantes foi Pep Guardiola, ao transformar o antigo futebol total no espantoso e bem-sucedido jogo de posições. 

O treinador catalão adaptou o talentoso Lionel Messi como falso nove, criou um sistema que prioriza a posse e inverteu a orientação dos pontas. O sucesso estratosférico de Guardiola só foi freado por uma variação física e aperfeiçoada de seu próprio jogo de posições, executada pelo Bayern de Jupp Heynckes na Liga dos Campeões em 2013.

Notas finais

Ao mostrar como os técnicos de hoje trabalham sobre o legado dos do passado, Jonathan Wilson ajuda a entender o futebol sob uma perspectiva mais profunda. Desde o simples sistema de passes do Queen’s Park até o moderno jogo de posições do Barcelona, o esporte evoluiu e se reinventou.

Dica do 12min

Alguns técnicos reinventam a forma com a qual o futebol acontece no Brasil. É o caso de Jorge Jesus, com um Flamengo que acumulou mais títulos do que derrotas. Miriam Assor conta a história do treinador no livro “Jorge Jesus”, que você pode conferir no 12 minutos.

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Quem escreveu o livro?

Jonathan Wilson é escritor e jornalista britânico, sendo autor e colunista em publicações como The Guardian, Sports Illustrated,... (Leia mais)

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