Delírio do Poder - Resenha crítica - Márcia Tiburi
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Delírio do Poder - resenha crítica

Delírio do Poder Resenha crítica Inicie seu teste gratuito
História & Filosofia

Este microbook é uma resenha crítica da obra: Delírio do poder: Psicopoder e loucura coletiva na era da desinformação

Disponível para: Leitura online, leitura nos nossos aplicativos móveis para iPhone/Android e envio em PDF/EPUB/MOBI para o Amazon Kindle.

ISBN:  978-8501116512

Editora: Record

Resenha crítica

O poder é uma doença

Outro nome possível para este livro seria “O poder é uma doença”. Por mais genérica que essa frase possa parecer, ela é uma boa definição de tudo o que a autora diz ter vivido e visto de perto, especialmente na campanha para o governo estadual do Rio de Janeiro e em meio à condenação de Luiz Inácio Lula da Silva, que assina o prefácio da obra. 

Encontrar uma cura é difícil e há os que se sintam viciados. Poucos conseguem se desapegar do poder, muitos deliram com ele. Mas, afinal, como podemos entender o quanto uma coisa está ligada à outra?

Delírio: uma definição

Muito estudado na Psiquiatria e na Psicologia, o delírio aqui citado tem sentido filosófico. Um conceito, uma categoria para analisar e entender com mais detalhes a sociedade atual. 

Há um delírio como forma de mentalidade psicossocial, que alterna entre uma confusão mental e uma condição de fascínio, êxtase. Também há o delírio coletivo que nos mantém hipnotizado. Tais delírios coletivos fazer emergir figuras nocivas, autoritárias e cruéis.

Hitler 

Quem conhece um pouco de sua trajetória pode imaginar que ele era um sujeito apenas com problemas. Mas Hitler viva um delírio de grandeza, presente também nas promessas de Donald Trump.

Todo delírio tem uma fantasia embutida. Nesse caso, a fantasia de uma raça ariana levou tanta gente à morte em campos de concentração ou fronts de batalha. 

É importante compreender os delírios para que se possa administrá-los. 

Delírio administrado

Para administrar os delírios, deve-se compreender suas formas de existência. O delírio clássico faz o sujeito delirante tratar fantasias como realidade. Por outro lado, há situações em que a realidade surge, como uma falsidade, por meio da fantasias. Aqui, a realidade é negada sistematicamente e o sujeito delirante não acredita em nada que surja por meio de argumentos racionais. 

Tiburi intitula esse tipo como um “delírio negativo”, que leva a comportamentos padrões, repetidos, feito robôs. 

Robôs

Quando movimentos inteiros de pessoas assumem delírios negativos com propósitos políticos, há a repetição do mesmo comportamento delirante. São robôs programados para fantasiar.

Para a emancipação de tais sujeitos, é comum o uso da violência sistemática para a marcação de seu lugar, de sua opinião. Parece familiar, não?

O bem que o outro nos faz

Em situações e teorias delirantes, o outro surge como salvação da própria realidade. Por vezes, o outro pode ser alguém próximo, imaginário ou mesmo simbólico.

Esse outro nos faz bem, quando seres delirantes, pois surge como a única solução para sair daquele lugar, de uma situação de paralisia qualquer. 

Teorias delirantes na era da pós-verdade

Não pense que os delírios surgem de maneira aleatória. Em tempos de pós-verdade e legitimação de fake news, o delírio funciona de maneira organizada.

Há método em sua disseminação e legitimação. Os delirantes sequer se enxergam nessa condição e entram numa guerra sem fim. 

Guerra psíquica de todos contra todos 

O delírio das massas, proporcionado pela escravização digital que vivemos, faz com que o clima, já tóxico, seja de guerra permanente. Todo aquele que contraria suas teorias delirantes é um adversário a ser combatido. 

A ideologia de guerra permanente gera um mal-estar psíquico e todos se enxergam como potenciais inimigos. Assim, pensamentos razoáveis tornam-se urgentes.

A urgência dos pensamentos razoáveis

O momento é de necessidade de reafirmar questões simples e óbvias. O delírio coletivo torna as pessoas mais egoístas e, quanto maior a convivência com pessoas que o alimentam, maior sua disseminação. 

Mesmo quem vive só, longe de contato humano, é afetado diretamente pelo delírio. A vida digital modificou nossa relação com outros seres humanos, além de ter fortalecido o egoísmo com a ilusão de estarmos todos juntos. 

É dever de todos nós disseminar a racionalidade e a razoabilidade. 

A força do delírio

Em 2017, Marcia Tiburi dizia no livro Ridículo Político que havia um fortalecimento da idiotização vergonhosa de personagens políticos de projeção nacional.

De lá para cá, sua conclusão foi a de que tornava-se imperativo conversar sobre o delírio. Ele não é um capital político como a força do ridículo. O delírio, na verdade, é o que permite e fortalece a existência do ridículo. É o núcleo, o coração do poder, enquanto o ridículo não passa de  da aparência apta a ser manipulada. 

Iniciativas políticas sérias devem levar isso em consideração se desejam, de fato, mudar alguma realidade existente. Afinal, o delírio é disseminado e naturalizado por parcelas consideráveis da população como algo impossível de ser modificado e também é uma escapatória simples para um mundo de problemas complexos. 

O delírio de poder e a fuga do sofrimento 

Quem delira vive de convicção, nunca de provas. Acredita em sua autoverdade, uma forma de desconsiderar o que é real como algo a ser buscado constantemente. 

O sujeito delirante acredita em suas fantasias como uma certeza, uma garantia. Embora a verdade não tenha dono, eles buscam capitalizar para si a única versão de fatos fantasiosos. E quem discorda é inimigo. 

Não há como se comunicar com esse tipo de sujeito. 

Incomunicabilidade

Chegamos à metade deste livro para tratar de uma proposta de Tiburi: avaliar como a existência com o poder pode modificar as pessoas. 

Durante a convivência em meio à campanha eleitoral, a autora se deparou com pessoas que não riram ou sorriram por meses. Eram semblantes mortos, de pessoas incomunicáveis. 

Havia quem não se dispusesse a entender a mentalidade delirante de parte dos eleitores e da sociedade brasileira atual. Um equívoco: se não somos capazes de compreendê-lo, acabamos por fortalecer um traço comum na sociedade digital em que vivemos. 

Falando francamente

Há uma responsabilidade concreta em cada ato político do cotidiano. Em nossa era, devemos falar as coisas diretamente, sem rodeios, para afastar toda  e qualquer possibilidade de fantasia causadora de males maiores. 

Do artista visual ao que expõe suas pinturas nos muros dos centros urbanos, do músico erudito ao popstar, do jornalista ao escritor, todos temos responsabilidade grande em apontar o dedo na realidade delirante e cada vez mais massacrante vivida por todos. 

Não se deve dar margens aos passadores de pano ou àqueles que disseminam ideias falsas como realidades, passíveis de manipular milhões. Os que manipulam a realidade delirante de nossos tempos buscam fazer com que a política pareça algo abominável e suja para pessoas comuns se afastarem dela. Dessa forma, a manipulação é constante. 

Quando se fala em pessoas alienadas da realidade, há aí um projeto, não uma coincidência. Cada ato tomado no dia a dia é um ato político. Cada ser é um ser político. 

E faz-se cada vez mais necessário exercer essa capacidade de mobilização, apontando para o real e denunciando o que é irreal. 

As mulheres sempre se justificam

Historicamente, a política é um território dominado e ocupado por homens. Tiburi sentiu isso quando fez campanha para o governo estadual do Rio de Janeiro.

Sua presença ali e os constantes questionamentos sobre os motivos que a levavam a se candidatar traziam um traço claro de misoginia. 

Constantemente, havia comentários em sua direção dando conta que ali não era um lugar para ela. Não por questões técnicas ou de habilidades, mas por gênero. As mulheres são provadas a todo tempo e o fator gênero sempre entra no cálculo da justificação de cada atitude tomada por elas quando adentram em espaços públicos de debate, seja ele político ou de outra esfera. 

Como se fosse natural a pouca presença feminina em espaços públicos. Muito por isso, a tentativa de manter os eleitores e cidadãos comuns alienados é mais um projeto perverso. 

Falta de poesia e outros clamores

Quando setores artísticos e culturais são constantemente atacados, não é à toa. Isso deixa ainda mais apavorado aqueles fora dos sistemas delirantes de pensamento.

A falta de poesia e de outros clamores culturais, que nos fazem enxergar a vida para além da crueldade neoliberal, com o dinheiro como único objetivo, legitima situações de barbáries.

A falta de poesia e arte nos faz ter apego à culpa, ao pecado, a valores que nos punem por todo o tempo. 

Sem pecado nem culpa, um experimento radical

Vivemos tempos em que culpar os outros é um dos maiores prazeres, seja individual ou coletivamente. Viver uma vida sem culpar ninguém é um ato revolucionário.

Perceber que somos livres de pecados e outras punições é libertador. Não há delírio sem culpa, sem apontar o dedo, sem a criação de um inimigo, mesmo que invisível. 

O pecado e a culpa são armas comuns nas mãos de políticos que abusam da teatralidade e canastrice para se manter no poder. Em tempos de acusação e punições digitais, viver sem pecado e culpa é um experimento radical. 

Assédio audiovisual: a câmera como arma 

Em tempos delirantes, cidadãos comuns criam emboscadas midiáticas. O celular virou uma arma do mundo contemporâneo, em que todo mundo se sente como criador de notícias e fatos, compartilhando mesmo absurdos em tom de denúncia para familiares e amigos. 

Em suas andanças pela campanha eleitoral, se deparou diversas vezes com cidadãos portando celular e usando da agressividade em busca de reações ou mesmo falas controversas com o intuito de acusar, denegrir, explorar o outro. 

Tal ação é o embrião das atuações de verdadeira milícias digitais, que assassinam reputações usando falas descontextualizadas e outros artifícios. Veja como a mentalidade delirante é nociva em termos coletivos: as mentiras palatáveis viram verdade nos tempos em que a vida digital muda nossa percepção da realidade. 

O fracasso

Continuar é resistir, manter-se vivo e potente. Mentiras surgem e surgirão, mas a luta é para que elas não se tornem hegemônicas e dominantes. 

A luta contra a verdade é constante. Devemos nos postar sempre a favor da lucidez contra a estupidez, do esclarecimento contra a barbárie, em todos os níveis e mesmo depois das derrotas, como a que Tiburi sofreu em 2018 ao sequer chegar ao segundo turno. Mas sua atuação política não parou. Não para. 

A inevitável vida comum e a política que há de vir

A vida política não para. Vivemos tendo algo em comum uns com os outros. A vida coletiva é inevitável à existência, já que não estamos sós no mundo. Garantir um espaço de subjetividade livre é fundamental para derrotar o delírio que nos cerca.

Ninguém é dono da verdade para torturá-la como em nossos tempos. 

Não temos mais o direito de ser nada, além de político. Entenda que nem só o candidato é político. Todos nós somos, no dia a dia, até mesmo ao ler este livro. E sua participação é fundamental para o fim de mentalidades delirantes e manipuladoras. 

Notas finais 

A alegoria da caverna de Platão é uma boa explicação para o delírio esmiuçado por Marcia Tiburi neste Delírio do poder: Psicopoder e loucura coletiva na era da desinformação.

Perceber o quanto a manipulação coletiva gera desastres públicos é fundamental para o melhor entendimento da realidade vivida em tempos de pós-verdades e fake news. 

Há método, há estratégia e não há pudor ao fazer de cada um de nós, cidadão comuns, meras peças de um quebra-cabeça de poder. 

E entender o jogo é um bom primeiro passo para esclarecer os que nos cercam. 

Dica do 12’

Os tempos digitais mudam constantemente nossa percepção de vida e de mundo. E para entender um pouco mais como isso afetará as próximas gerações, a leitura do microbook Como criar filhos na era digital é uma boa pedida! 

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Quem escreveu o livro?

Márcia Angelita Tiburi, autora desse livro, é uma professora universitária, filósofa, artista plástica, escritora e política brasileira. Com suas análises e seu ponto de vista, é possível ter uma m... (Leia mais)

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